“Deixa-me falar-te do novelo”
- BrunaSanta
- 3 de mar. de 2021
- 2 min de leitura
Seremos mercadoria?
O que é a mercadoria?
O que deverá ser a mercadoria?
Vivemos numa sociedade seletiva. Infelizmente, como acontece em todas as sociedades, existem passados dos quais não nos conseguimos orgulhar, mesmo com todas as vitórias que permanecem registadas nele. Não podemos, porque seria um sentimento contraditório, causaria um tumulto interior, concordar com o que não nos é possível tolerar.
Desde os primórdios do funcionamento de um nó envolto num novelo, houve necessidade de estabelecer laços com os pequenos fios de variadas cores, estabelecer laços, no sentido de trocar cores, texturas, larguras. Esta “ troca” passava inicialmente por meros pedaços de novelo, até que começou a envolver metais, dizem-se mais elegantes, de uma outra estirpe. Queriam-no-lo todos, procuravam-no-lo incessantemente.
Os pedaços que constituíam o novelo começaram a refletir sobre o que poderiam dispor para lhes ser dada a oportunidade de, só com uma brisa próxima, conseguir sentir a luz reluzente e – aparentemente – cómoda. Era imperativo prosseguir com aquela ideia brilhante, tão brilhante como a luz de um vale coberto de nuvens: trocar o metal por pedaços de novelo. Porque não? Qual seria o motivo para não o fazer? Afinal, de acordo com os pedaços de novelo, havia claramente uns superiores aos outros, além disso sabiam que nunca iriam ser eles, tinham uma camisola assegurada para si.
O significado de mercadoria tinha mudado de uma forma bastante significativa, agora os pedaços de novelo também vendiam pedaços de novelo, para obter um alento ilusório daquela luz, cada vez mais próxima, cada vez menos nítida. Ora, como seria de esperar, e, ainda bem que corresponderam às nossas expectativas, os pedaços de novelo trocados revoltaram-se e impuseram a sua textura, cor e largura, já para não falar do seu comportamento. Os ditos privilegiados, a princípio, tentaram dominá-los, até que, acabaram por abrandar aquele dominó emaranhado na avidez sofrível dos nós constituintes dos novelos. Ainda que alguns nós tenham cedido ao desatino dos seus ancestrais, ainda estes existem.
Estar atento, agir em prol do outro e não aceitar injustiças são o que faz com que o novelo não esmoreça.
Não, não somos mercadoria.
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